8 de abril de 2010

Sobre a literatura Russa

Os escritores vão à china
escrever livros.
Estão lá e escrevem mal da China
e dos chineses

E foram tão felizes na China.
Conheceram tantas chinesas.

9 de fevereiro de 2010

Quando não há reciprocidade no amor,
resta a obsessão:
a canção proibida da humanidade,
sem toque e humidade

22 de janeiro de 2010

Quadra sobre a nossa pequenez

Um rapaz nasceu em 87,
pisou uma seringa infectada em 98.
actores são como biscoitos,
onde há 1, há 18.

21 de novembro de 2009

Os campos parecem mais vívidos quando nos vamos embora

{para a Sara,
porque os comboios acabam por parar onde queremos}


Os comboios andam sempre,
mas vagarosos,-
ténues como fumo de crematório,
fugazes-
quando há saudade.

Porque,
a saudade interfere como meteorito
na mecânica.
Oxida,
tolda-nos o pensamento como vendas nos olhos.

Toda a ciência,
sobretudo a Física,
devia estudar os efeitos da saudade.
Devia analisar a saudade como analisa átomos
(que são tudo, um espaço de matéria) porque
a saudade interfere na própria concepção do átomo.
(Um comboio que chega a horas atrasa-se,
quando há saudade);

Os comboios param sempre (a horas, atrasados ou descarrilados)
vivem na obrigação marcial do tempo e da Física –
chegam-nos, vemo-los.
A saudade anda sempre em nós, nunca chega e está lá,
É o tempo, a obrigação marcial do tempo.


20 de setembro de 2009

Pretérito Imperfeito

Lembras-me as velas
que ardem e
deixam cera de licor na pele:
um mar rúbeo de
tochas submersas como
sereias

Lembro-me
das vezes em que éramos
génese de romance de cordel
e os dias eram peça de teatro sem actos
E lembro-me
de o amor ser dogma
e o sol a encher e vazar
como onda ininterrupta entre duas praias.

Agora há só um quarto azul-baço
uma cadeira caída, cama desfeita.
as palavras são
perenes monólogos néscios
sem a metafísica das palavras que jurámos

E o poema sem sereias é apenas matéria.

10 de setembro de 2009

da ausência (III)

Como pérolas enterradas;
garfos presos por fios inextinguíveis à garganta;
nós em mesas lascivas / naturezas mortas que resfolegam;
tecnocratas a lápis e papel.

Cego
passeio à beira-rio
primavera húmida em flor:
lírios escamados de guelra, rio-manta que os afoga;

o negro sensorial dos
olhos turvos
tacteia a água-filha
que escorre pelos dedos
como areia na ampulheta

O rio passa.
E as mãos recolhem ao leito
desmesurado e eterno
das sombras

3 de setembro de 2009

A ausência planta-nos ciprestes

















A ausência planta-nos
ciprestes
em torno dos
prados renascentistas vetustos
que eram presença verosímil de alguém

em volta tudo é negro fúnebre.
Tudo se resume à constância extasiada de
lápides cinzentas granitadas sem
epitáfios de memórias salvadoras;
e corvos enchem o céu e cobrem o
sol morto de penas pretas cintilantes como
espelhos.

E um dia de ausência é um ano,
século de ermita em gruta,
Zaratustra sem filosofia que console,
sem sol que seque lágrimas descendentes
rios que percorrem olhos lacustres e desaguam em bocas oceânicas

O sonho voa alto
morre e renasce como fénixes
mas no fim há chama e pó. E os
olhos,
obstinados como religiões no século XXI,
buscam na ausência do corpo
o paraíso da carne.

21 de agosto de 2009

11 de agosto de 2009

Ausência, poema para ler devagar



















Os gatos dormem,
etéreos como borboletas em almofadas;
ervas que nascem no céu e
pendem,
tocam-nos na testa como chuva
de fogo
que arde
quando arrefece na pele
da consciência

Quando morrem pessoas
as ervas crepusculares nascem
da sua memória,
descem até nós,
roubam-nos água dos olhos e

A pessoa torna-se telúrica -
e todos os rios, todo o chão,
são ela
e são dela
todos os risos e choros e olhos
porque,
quando nos morre uma pessoa
ela desce e cai em nós.

12 de julho de 2009

Poema e Poeta são o mesmo















um poema
é dedos que já não são dedos.
osso apenas
mãos que escreveram poemas lidos
quando o poeta era poema
em potência

Há no poeta do poema
poemas de poetas distantes
mas ubíquos no corpo, dedos como deuses.
Há músicas que não se conhecem sequer
[são de outros poemas
ou de outros poetas]

Há um fosso
entre o poeta e o poema
uma construção vertiginosa do acaso
que se transpõe com um passo
porque o poema,
na sua essência, é o poeta.


Pintura: Depois da orgia, de Cagnaccio di San Pietro

8 de julho de 2009

Lembrei-me logo do que tenho passado com o Mann


uma corrida muito difícil. Melhor, uma maratona.
Quem corre por gosto não cansa.

2 de julho de 2009

23 de junho de 2009

17 de junho de 2009

Que música!

GOVERNO - Meio Bicho e Fogo from 8 e Meio on Vimeo.

o valter hugo mãe destaca-se em tudo o que é sítio. Quando for grande quero ser como ele!

11 de junho de 2009

O beijo


A bomba caía,
Leve.
[Asas dúbias,
Ícaro de pólvora com asas de metal que derretem no sol
o]

Risca o céu;
enviesa,
cruza pórticos transcendentes que clamam a deus,
pórticos que sopram em vão os rastilhos
acesos como sóis em quartos escuros
que se esmorecem sobre a terra e
atingem a matéria das flores.

os campos aninham-se.
jazem juntos. Amontoam-se corpos nus.
[as explosões são tão eficazes a unir pessoas
que as destroem]

Antes da morte há segundos em que se ama o mundo
como é
ama-se tudo de todas as formas,
formas saudosas,
imagem exangue de
lírios a baterem com as pétalas noutros lírios.

explosões influem e o amor é tanto
que somos todos os dois amantes do desenho de klimt.
no fim
a cegueira é imagens de lírios.


29 de maio de 2009

Poemáti

Punctuns fora dos limites da película;
Antologias fugazes de mim. São
Terras azuis, flores plantadas no crepúsculo:
Retina prisioneira de ti. A
Inteligência é ignóbil, acessória no
Centro da cena, sem pano, sem guião. Só corpos
Incendiados
Audazes. Actuando.

Aspergido o ar
Morre o espaço envolvente;
O espaço confinado a um corpo (sucedâneo do meu)
-
Tempo, a
Envolver-nos.



28 de maio de 2009

Copos em Corpos


Para deleite do corpo existem os copos. E existem copos cheios até cima com água divina,cores ébrias que entram e invadem pântanos interiores. Bebe-se um trago e esquece-se tudo o resto senão a alegria que é ter dinheiro para continuar a comprar quem nos traga copos cheios.

27 de maio de 2009

A Dança

Os ponteiros corriam breves.
as horas passavam,
eram aranhas que teciam teias
e enredavam o tempo
em matéria contável.

Os relógios diluem a vida,
solventes atirados a um quadro realista
(depois temos Mondrian)

as pessoas dançam,
o tique-taque pauta elipses de tango.
As saias rodaram, rodam
-tique-taque-
rodarão.
a música mecânica paira no ar ditoso.

Rodam as saias e as raparigas rodam-nas.
Titeriteiras, mexem em fios de algodão,
controlam o tempo das saias.
Nas costas das raparigas
fios invisíveis movem-se ao som da música.

Tudo é dança quando em cima estão ponteiros,
a vida é um trecho de tango
quando ouvimos por detrás do violino,
do piano,
do bandonéon,
o tiquetaquear do metrónomo absoluto.

Os dançarinos moviam-se presos ao chão.
livres naquele espaço
eram pêndulos sincronizados ao segundo,
que os destruía.



19 de maio de 2009

Se x fosse uma personagem (onde se fazem comparações)



Se Portugal fosse uma personagem de um livro era o
Benjy de O Som e a Fúria.

Para ouvir muitas vezes

Vale a pena ouvir a entrevista de Carlos Vaz Marques ao já saudoso Vasco Granja. Um homem que vivia em paz com ele e com o mundo.

22 de abril de 2009

Monólogo de um deus solitário




A carne exala credos:
É todo um rosário de madrepérolas vermelhas,
úteros em ebulição.
Carne que é extensão da libido quando ouve orações a virgens
fecundadas

Sentado na Mesa,
doze lugares vagos. Ecos da minha voz.
Eu, a minha Carne e a Roupa somos Espírito santo;
a Santíssima Trindade pedindo um café!

Não queremos pão!,
gritam.

'Não há fome,
Não há palavra,
não há ressurreição!’
brado a paredes surdas, altares sem hóstias,
vinho, não há batinas,
as velas apagam-se.

riem-se.
São cordeiros que assistem, hereges,
à derradeira missa.
uma paisagem idílica ao fundo:
lírios, magnólias, espinhos cravados em cabeças suadas.
éden sentiria inveja deste horizonte
mas os risos torrentes
violentam pulmões de cordeiros.

Por isso nego anjos, trombetas e anunciações.
Gabriel em decadência!

20 de abril de 2009

Post-Scriptum

A partir de agora maior parte dos meus poemas e afins vão estar no Texto-al. Se não conhecem é boa hora para o fazerem. O Banqueiro Anarquista passará a ter, para além de alguns poemas, outro tipo de desabafos (embora ainda não saiba quais).

11 de abril de 2009

Reflexo psicanalítico de um Édipo




As mulheres correm plenas de ar
por entre vácuos recém-nascidos
que as respiram,
consomem-nas carnalmente
como cigarros durante a guerra

Da cópula sai terra,
fogo,
Rebentam-se as águas
e o lume que saía
escorreito
extingue-se como o sexo pueril
na sociedade pré-freudiana.

Saem bebés das lúgubres mulheres.
Munem-se das facas bronquiais, dos laços umbilicais.
são causa primeira dos rasgos na polpa maternal,
que expele CO2 e H2O com corante vermelho-carmesim.

Há lápides pintadas de consaguinidade no fim

6 de abril de 2009

O semblante de um homem angustiado

é uma sala vazia com uma natureza morta no meio, em cima de um cavalete (as tintas ainda escorrem sobre a tela). O tecido dos sofás, de tão puído, cede a sua consistência ao próximo que se sentar. Mesas são tripés; as pernas soltas são lanças enfiadas em frigoríficos que expelem pelos poros improvisados tetrafluoroetano, que inunda a sala e a transforma num Alasca tóxico de emoções.




19 de fevereiro de 2009

metafísica


As flores batiam-lhe na cara
e o pólen,
colado,
parecia sangue seco.

A natureza fere-nos
com sentimentos pendulares
que ascendem e descendem como vidas,
pessoas em elevadores,
mulheres que caem,
crianças corrompem úteros como ervas daninhas
corrompem o asfalto

Apareciam carros
desapareciam pessoas.
Ascendiam homens
e a mulher desaparecia
com eles.
A flor violenta na cara rigorosa
era raiz de pensamentos severos.
Deixava feridas que não fluíam como água em leitos.
Eram água seca, pele seca.

Não era natural,
morria sempre que a natureza actuava.
sempre que ela respirava.

E não sabia da existência da morte.

5 de fevereiro de 2009

matéria


Quartos escuros,

Cores opacas e disformes,

Ecos suspirados aos ouvidos de virgens alarmadas,

Penetradas por luzes vagas.

vagões austeros de cores inebriantes.

Cheiros metamorfoseados

Nascem sons doces
degustados.

Salpicos céleres de seres,
sombras que são.

Fotossíntese numa câmara escura,

Fotografia natural, meta-verde,

Pálida,
florida graças à mão do Homem-Deus.

4 de fevereiro de 2009

Simbiose

Chego e entro,
O café e a empregada jazem no mesmo sítio;
Mudos.
Suplicam por mim,
enchem as pupilas nauseabundas de luz
ao verem-me ser cliente.

Sento-me no lugar da cadeira;
não se incomoda e dá-me as boas vindas
de quatro.

Cheiro o ar e sou pulmão
do café, respiro por ele.
depuro

Chega a mulher, arrasta-se, exaspera,
reza pelo pedido com olhos moles
que parecem beatas no chão.
Consumida.
:
-um café e um pastel (s.f.f.)

(traz-me tudo aquilo como se traz uma hóstia,
como quem crê na salvação através da comida)

Bebo, como, leio Dostoievski
e a mulher arrota por mim. Alegra-se por ser miserável.
Se lhe pedisse, vomitava.
:
-A conta se faz favor.
Pago, saio e sou metástase.

Saídas nocturnas



Saio de casa e são sempre noites que
encontro.
tocam-me na fronte,
disparam morcegos e almofadas.
são ovelhas na tosquia, secas,
(sem o romantismo inglês da
lã.)
almofadas sem lã disparadas sobre mim.

Ruas graves, pintadas de crime,
e os candeeiros são testemunhas:
apontam com os dedos
luminosos para lá.
Os meus pés presenciam um genocídio de
formigas, de sémen que é dispensado
sempre que piso o chão.

E a rua enche-se de breu.
caem os candeeiros
e as estrelas presas aos candeeiros,
e as mãos
e as roldanas que as movem caem também.
Os pés, esses, continuam.
São breu,
sou eu.

1 de fevereiro de 2009


Corpos deitados são quadros que
não foram pintados, gatos que ágeis

Interrompem a vigília e saltam para o sono.

São pinceladas de vácuo numa câmara escura,

Linhas de uma fotografia desbotada.

Corpos que irrompem e atentam em ancas decididas,

Movimentos em elipse que extasiam.

Explosões,

Implosões
que engasgam e tiram ar,
Retribuem com o sangue pulmonar aéreo
,
Que sai pelo nariz e evita a queda,


levita.

E o ar é encarnado como rosas,
Encarnado como os caules agressivos das rosas.


Olho os corpos e vejo ancas e elipses e gatos

que de tão mortos vivem mais uma vida.

Vejo mesas com frutas, árvores que nascem da madeira da mesa e rezam a Deus

enquanto as ancas e as pernas e os gatos choram.
E todos são corpos,
todos entidades que cheiram a terra, e a ar,
e a sangue.

30 de janeiro de 2009

Hipocondria

Ar sem garganta.
Nariz inerte, deserto.

Dissolvemos o açúcar em água quente como o
Crematório dissolve corpos.
Pessoas-vapor voam pela chaminé.
sem asas voam sem serem anjos
(porque dos anjos nada se sabe; eunucos não falam muito).
E a inércia é detida pelo acto da ebulição,
pelo osso que agora é pó, pela boca que é tudo menos palavra,
que é ar,
que é breu,
que é chaminé,
que é voo. Que não é material humano.
Porque homem não voa senão na morte.
E já não sendo homem é natural,
sem roupa,
sem boca,
sem nada senão o pó de uma sala que se limpa e se esquece.
Assim somos, matéria com validade para a lembrança.
Souvenir que começa no falo e acaba na chaminé fálica.
Somos sacos que carregam tumores como quem carrega frutas em sacos.
Tísicos seres plásticos que crescem e se transformam em ar de chaminé.